quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Jesus ser judeu, é apenas um detalhe!


Jesus, é detalhe!
Dada a tradicional pergunta "afinal vocês acreditam ou não em Jesus Cristo?", a resposta mais inteligente que eu já escutei foi esta:"nós judeus acreditamos que o Messias virá. Vocês cristãos acreditam que ele já veio, mas voltará. Portanto, numa coisa nós concordamos - ainda vem alguém pela frente. Alguém ainda está para vir. Muito simples! Basta aguardar o Messias e, quando ele chegar, perguntamos se essa é a primeira ou a segunda vez que ele aparece por aqui...".
Se Jesus é ou não o messias não é a pergunta mais importante que divide o Judaísmo do Cristianismo. A grande questão que difere os dois sistemas religiosos é a ênfase que cada um dá para fé e ações. De acordo com o Judaísmo, D'us considera as ações das pessoas muito mais importantes do que sua fé. "Melhor que (os judeus) Me abandonem, mas sigam as Minhas leis" (Talmud Y. Hagiggah 1:7). Agir de acordo com os princípios éticos e morais judaicos é a obrigação central dos judeus. O Cristianismo, por outro lado, à medida que foi se desenvolvendo, deixou de lado a quase totalidade das leis e transformou a fé no seu ponto central. No início as diferenças eram praticamente insignificantes. O próprio Jesus afirmou que "não imaginem que eu vim para abolir a lei dos profetas (...) quem infringir a lei será o último para ir ao reino do céu" (Mateus 5:17). Com o passar do tempo, a derrota para os romanos em 70 e.c. e a influência dos apóstolos, notadamente Paulo, a lei foi sendo abandonada. Com o advento do protestantismo, os sacramentos católicos foram eliminados, mas não a valorização exclusiva da fé. Lutero escreveu que "a fé por si mesma, sem os sacramentos, justifica, liberta e salva". Esse processo teve um efeito cataclísmico no distanciamento entre nós e os cristãos.

Existem três dogmas que derivam dessa diferença fundamental. Para os cristãos, acreditar nesses dogmas é necessário para resolver alguns problemas que seriam insolúveis caso os dogmas não existissem. Trata-se do "Pecado Original", da "Segunda Vinda" e do "Perdão através da morte de Jesus". Ah, nenhum destes dogmas estão na Torá. Para os judeus, esses dogmas não são necessários porque esses problemas nunca existiram. E de fato não existe, igual "judaísmo messiânico". O Cristianismo estabelece que todas as pessoas nascem pecadoras, estando nessa condição de forma hereditária. Paulo escreveu que "o pecado veio através de um homem e através de outro homem que ele será removido" (ética IX). Assim, apenas o batismo, e nada mais, tem o poder de salvar o ser humano. Seria uma espécie de antídoto universal para o pecado que nasce com cada pessoa, desde os tempos imemoriais. Para o Judaísmo, "Pecado Original" não é problema. A noção de que as pessoas nascem pecadoras não é judaica, procure na Torá! Não tem... Cada pessoa nasce inocente e cabe a elas tomar as suas próprias decisões morais e escolher se ela quer ou não pecar, isto tem um nome, se chama livre arbítrio e responsabilidade.

Outro problema Cristão é o fato das profecias messiânicas não terem se concretizado quando da vinda de Jesus. Como pode Jesus ser o messias se nenhuma das principais profecias se tornou realidade? "Nação não levantará a espada contra nação, nem aprenderão mais a guerra" (Isaias 2:1). Não é preciso ser um especialista em história para saber que, nesses vinte séculos de era cristã, isso não se concretizou. A solução oferecida pelo Cristianismo é o conceito da "Segunda Vinda" de Jesus, quando finalmente a era messiânica chegará. Para os judeus, esse conceito não é aceitável porque a Torá nunca mencionou uma segunda vinda do Messias.

Além desses elementos, existe o problema de que as pessoas não podem obter salvação através de suas ações. Para resolver isso, desenvolveu-se o dogma da fé em Jesus como única forma de salvação. Nessa solução, como foi observado acima, o Cristianismo difere profundamente do Judaísmo. Quais pecados a morte de Jesus estaria removendo dos ombros da humanidade? Como a Torá afirma que apenas o povo judeu pode ser cobrado pelas obrigações homem-D'us, então a morte de Jesus só poderia estar perdoando a humanidade pelos pecados homem-homem. Essa doutrina se opõe diretamente ao Judaísmo e sua noção de culpabilidade. De acordo com o Judaísmo, nem mesmo D'us pode nos perdoar pelos crimes cometidos contra outros seres humanos. Apenas a pessoa atingida tem o poder de nos perdoar, sabia disto?

Por fim, existe a diferença fundamental em termos da atitude para com os agressores. "Não ofereça ao mal nenhuma resistência. Pelo contrário, se alguém te bater na face direita, ofereça a ele a esquerda também" (Mateus 5:38) e "Ame os seus inimigos e reze pelos teus perseguidores" (Mateus 5:44). O Judaísmo, por outro lado, exige que os agressores sejam poderosamente resistidos. A Torá cita o exemplo de Moises, quando mata o capataz egípcio que batia em um escravo judeu. Do judeu é exigido tratar seus inimigos com justiça, mas não existe nenhuma indicação nas fontes de que um judeu deve amar seus inimigos. Nenhum judeu é obrigado a amar um nazista, por exemplo, como poderia sugerir a declaração de Mateus.

Apesar das muitas diferenças entre nós e os cristãos, essas diferenças não devem em hipótese alguma ser obstáculo para um excelente relacionamento entre as comunidades. Os dois sistemas religiosos compartilham valores e objetivos bastante similares. Ambos querem um mundo mais ético e humano e as pessoas religiosas das duas comunidades devem se ajudar nesse intento. No entanto, em uma época em que movimentos missionários cristãos das mais variadas estirpes lançam campanhas de conversão de judeus, é importante conhecer as diferenças entre nós e os cristãos para termos claras as linhas vermelhas que separam cada religião.

Artigo baseado nas obras de Dennis Prager e Joseph Telushkin. Tradução e colaboração de Selma Bias Fortes.

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